museus+educação
O tema da aula de hoje foram as diversas denominações e conceitos para as ações educativas, ações patrimoniais, ações museológicas... diversos textos foram disponibilizados para turma ler e debater, apresentei dois destes abaixo.
Começamos então pelo texto da Profa. Zita e da Profa. Carmem Zeli de Vargas Gil, trazendo todo viés histórico de que os bens patrimoniais que começaram a ser preservados pertenciam a apenas parte da população (elite). Que a memória nacional começou a ser construída através de objetos simbólicos como bandeira, hino, língua própria, fundadores, etc. Os museus eram uma espécime de local de 'ensino nacional'. Falam um pouco do surgimento da história dos museus (não vou repetir pois já falei sobre isso em outro post sobre o Museu Nacional e a Educação). As primeiras políticas públicas surgidas no séc XX para museus, como na UNESCO, e que em 1930 Mário de Andrade surge com seu 'anteprojeto' cultural para preservação do patrimônio artístico nacional. Um projeto a frente de seu tempo pois Mario já falava da preservação não apenas de bens materiais, mas também de culturas e saberes fazeres, os bens imateriais. Juntamente com Rodrigo Melo de Franco Andrade e Gustavo Capanema, apesar da ferrenha política do Estado Novo de Getúlio Vargas, nasceu assim o SPHAN antecedente de nosso atual IPHAN.
Em 1958 ocorreu no RJ encontro organizado pela UNESCO sobre os museus e a educação, evento que antecede os de 1954 em Atenas e 1952 em Nova Iorque. Em 1999 é lançado o "Guia Básico de Educação Patrimonial" pelas autoras Evelina Grunberg, Adriane Queiroz Monteiro e a Prof. Maria de Lourdes Parreiras Horta, ou 'Lurdinha' como chama carinhosamente a Profa. Zita, com a qual teremos uma palestra na próxima segunda-feira dia 09/10. E em seguida elas trazem diversos exemplos de ações-educativo-patrimoniais, como no município de Silveira Martins que realizou um projeto de identidade e patrimônio, e o Arquivo Público do RS, com caixas pedagógicas com temas para ensino fundamental (escravidão e gênero) e ensino médio (ditadura militar brasileira).
O próximo texto que li foi da Maria Célia Trigueiros Moura Santos, o texto dela é ótimo porque traz vários tópicos com conceitos sobre ações realizadas no museu, como coleta e documentação; ações que o museu deveria realizar, como formações para funcionários e troca de conhecimento com outros museus; bem como os benefícios para o museu e a comunidade com as ações educativas.
Fala que ações museológicas podem ser aplicadas dentro ou fora do museu, não precisamos ficar sempre limitados ao espaço físico do museu e suas quatro paredes. Que não podemos apenas considerar o ensino formal como correto, o ensino que vem de fora da academia ou não formal é tão valioso quanto; quantos vozinhos que conheço e são tão sábios sem jamais terem pegado um lápis na mão... Estamos vivendo a era da informação, somos a sociedade da informação, nunca produzimos tanto conteúdo como agora e ao mesmo tempo não conseguimos apreender grande porcentagem disso, até porque grande parte é inútil.
A autora diz que a escola é um patrimônio cultural alimentado por diversos patrimônios culturais, penso que assemelha-se a uma cadeia alimentar pois quando uma das trocas começa a não funcionar, todas as outras acabam sendo prejudicadas, pois ciclos irão terminar. Ela traz então a ideia de que muitas escolas acabam priorizando o ensino de outras culturas e acabam esquecendo de sua cultura local, principalmente no contexto em que estão inseridas, suas comunidades, e que se perceberem a potencialidade do museu poderão usá-lo como aliado do ensino e não ainda considerá-lo apenas como 'local que guarda coisas antigas e velhas'.
Precisamos perceber como processo museológico todas as ações dentro do museu e não apenas as que compõem o tripé (salvaguarda, pesquisa e comunicação) e que as ações educativas museológicas são também formas de comunicação. Aliás ela frisa como ações de extrema importância para o museu, que passam por todo um processo museológico tão importante, minucioso e que muitas vezes podem funcionar melhor para transmissão do conhecimento ou mensagem que quer ser passada, do que apenas a exposição.
Abaixo coloquei algumas das sugestões apresentadas pela autora a fim de
estimular a prática museológica, e que para ela refletem na construção do
conhecimento como produto final, portanto, educativas:
"• o museu, para atingir sua função pedagógica, deverá ter uma capacidade de produção própria, com questionamento crítico e criativo, sem, contudo, deixar de interagir com outras áreas do conhecimento. A pesquisa, como princípio científico e educativo, é o caminho para que o museu possa contribuir, efetivamente, para o desenvolvimento socio-cultural;
• a compreensão de que as ações museológicas de pesquisa, preservação e comunicação devam ser aplicadas em interação e como função educativa, aponta para a necessidade de uma ação integrada entre os técnicos que atuam em todos os setores dos museus, definindo metas e objetivos, em conjunto, ampliando assim as funções e os campos de aplicação das mesmas;
• é necessário compreender que não é somente o setor educativo do museu o responsável pelos programas com as escolas; a operacionalização das programações pode ser responsabilidade de um setor específico, ou de 12 vários setores, em interação. O que é mais importante compreender é que todas as ações museológicas devem ser pensadas e praticadas como ações educativas e de comunicação, mesmo porque, sem esta concepção, não passarão de técnicas que se esgotam em si mesmas e não terão muito a contribuir com os projetos educativos que venham a ser desenvolvidos pelo museu, tornando a instituição um grande depósito para guarda de objetos;
• 0 processo de interpretação do patrimônio cultural deve ser desenvolvido com uma função educativa e não instrucionista. Nesse sentido, memorizar características das coleções e alguns fatos relacionados à vida, no passado, para serem transmitidos aos alunos, ou fazê-los representar cenas e vivências do passado sem o afastamento e a reflexão necessários para compreensão do tempo do aluno e do tempo passado, com pensamento crítico, torna-se, até certo ponto atividade pouco produtiva. Freire (2000) nos lembra que “a questão fundamental não está em que o passado passe ou não passe, mas na maneira crítica, desperta, com que entendemos a presença do passado em procedimentos do presente. Destaca o mestre que, “nesse sentido, o estudo do passado traz à memória do nosso corpo consciente a razão de ser de muitos dos procedimentos do presente e nos pode ajudar, a partir da compreensão do passado, a superar marcas suas”;
• compreender o objeto, a manifestação cultural, como um ponto de partida para questionamentos, para comparações, para estabelecer conexões entre o velho e o novo, entre arte e ciência, entre uma cultura e outra, para uma análise crítica e para o estímulo da criatividade, fazendo a ponte entre os objetos e a cultura do aluno, potencializando o patrimônio cultural como vetor de produção de conhecimento. Para tanto, é necessário repensar os procedimentos adotados nos programas desenvolvidos com as escolas, superando as questões burocráticas, as limitações de tempo, a ânsia de mostrar, com uma postura instrucionista, toda a coleção do museu. Mais do que tornar-se conhecido e divulgado, o museu necessita ser vivido, compreendido como um local onde a tradição pode ser conhecida, percebida, questionada e reinventada, estimulando e apoiando, inclusive, a criação de novos museus;
• interagir com outras instituições, com os sujeitos sociais que estão fora dos museus, “sair da gaiola”.
(SANTOS, 2001, pág 12 a 13)
Museu assim como escola é lugar de construção de conhecimento, mas mais importante do que isso, com esse mundo de pre-conceitos e desigualdades em que vivemos, museu é local de transformação de conhecimento.
REFERÊNCIAS:
POSSAMAI, Z. R. ; GIL, C. Z. V. . Educação Patrimonial: percursos, concepções e apropriações. Mouseion (UniLasalle), v. 19, p. 13-26, 2014
SANTOS, Maria Célia Trigueiros Moura. Museu e educação: conceitos e métodos, 2001. [Artigo extraído do texto produzido para aula inaugural do Curso de Especialização em Museologia do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, proferida na abertura do Simpósio Internacional “Museu e Educação: conceitos e métodos”, realizado no período de 20 a 25 de agosto]
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